Já lá vão três anos que se deu fim a uma forma de governar que não deixou saudades a ninguém. Um consulado iniciado com Barroso e Portas caiu finado e sem glória meses depois com Santana e Portas às mãos de um presidente que não via forma de a governação tomar tino. Bem vistas as coisas, e analise-se a situação de qualquer perspectiva, a mudança foi claramente benéfica e, como todos não se esquecem de lembrar, estamos hoje em melhores condições para enfrentar os problemas que tingem o horizonte do que há uns tempinhos atrás. Em boa verdade, urge que se acrescente, que não se esperaria outra coisa e para pior, comparativamente ao ponto de partida, dificilmente seria possível. A verdade é que alguns sinais são realmente animadores enquanto que outros, podendo eventualmente ser diferentes para melhor. Em todo o caso, não permitem que se lancem as culpas para mais ninguém que não seja a determinação, a teimosia, a inteligência, a capacidade de inovação do Governo e, naturalmente, do seu Primeiro Ministro. Podem muitos dizer que as qualidades referidas primam pela sua ausência nas pessoas referidas, mas não é menos verdade que muito dessas criticas enfermam de perspectivismo em demasia. Outras, podem ser justas e acertadas, é verdade.
É precisamente esse desafogo institucional que é marcante na actividade do Governo e, além disso, a possibilidade de ir trilhando caminhos e encetado processos à custa de uma conquista sistemática do espaço politico e da usurpação ideológica da direita. Esta, mergulhada num populismo inconsequente, era incapaz de não só de regatear a conquista desse espaço como de contestar a apropriação ideológica de uma configuração social que o Governo fazia ao arrepio de uma certa lisura ideológica e, dizem muitos, contra o seu próprio programa. Não dizemos como um junta que por aí governa que as promessas são para as eleições, que cumprir o que se promete é luxo a que não dão cobertura. Mas a verdade é que ou há rigor nas promessas e vontade de as cumprir ou então, que se tire um governo “a sortes”.
Este cinzentismo transpareceu, velado, na reacção à contestação que um certa esquerda fez e faz do código do trabalho. Não contestamos uma certa razoabilidade da resposta, mas é verdade que também é já um lugar comum o recurso à acusação de imobilismo que se fazem a uma certa esquerda, marcada com o estigma de ser contra as reformas. Os cidadão que contestavam em Chaves estavam a soldo do PC... mas o Governo acabou por se contorcer ante a contestação!
Todos concordamos com o Ministro do Trabalho quando ele aponta como tarefa sua fundamental a necessidade de acordo em sede de concertação social... mas há uma realidade mais dura e mais básica que nos espanta não ser considerada. Os trabalhadores são nestes processos a parte mais fraca, acorrem à negociação com um estatuto insuperável de desigualdade e parece legítimo que esperem que quem se comprometeu a trabalhar numa certa linha de garantias ... que cumpra. Não só por respeito a um compromisso (que tantas vezes manda a razão que não se cumpra por força de um bem social maior a alcançar), mas acima de tudo porque o respeito desse compromisso remete para a garantia de um bem maior que é a preocupação com a justiça inscrita como estruturante de uma sociedade... justa. É ao Estado que cumpre garantir que as realidades fácticas não se imponham sobre os mais fracos a coberto das palavras mais mirabolantes e sob a capa da retórica mais refinada de “justiça social”; é aos homens que cabe cumprir aquilo que prometem. Se o objectivo é o acordo a qualquer custo numa negociação desigual, onde está então o poder do Estado?
O Eng. Sócrates tem razão no que diz porque está preocupado com a crescente razoabilidade da esquerda que desprezou e porque vê no horizonte imediato no partido logo à sua direita a perspectiva de fim do populismo político (reduto apenas de Portas e companhia) e a possibilidade de preenchimento com outro discurso, (outro rigor?), do espaço para o qual se alargou como tábua de salvação. Como Afonso Henriques terá de abandonar a conquistas a Norte para acudir às conquistas a Sul, e verá reclamar como vitórias de outros aquilo que com mérito conquistou.
Ou será que não sabe que os cucos não fazem ninhos?