09 outubro, 2007

Pois! (3)

«A democracia vive de movimentos, de mudanças, de dispositivos contratuais, de tempos fluídos, de dinâmicas permanentes de jogos dialécticos. Ela cria-se, vive, muda, metamorfoseia-se, constrói-se segundo um rítmo de querer oriundo das forças vivas. Ela recorre ao uso da razão, ao diálogo das partes envolvidas, ao agir comunicacional, à diplomacia e à negociação.»

Michel Onfray


1. A senhora Ministra deixa inscrito seu nome numa placa que falta à verdade. Para falhar a inauguração de um Pavilhão de uma escola, onde, parece, falta o essencial para ser o pavilhão de uma escola, qualquer motivo -- «motivo de força maior», dizem -- o é desde uma corriqueira ida ao cabeleireiro até, no topo da hierarquia das urgências, uma reunião com os sindicatos! Para preencher essa urgência há sempre um secretário de estado, descartável numa previsível remodelação, para cumprir a tarefa e dar «conta do recado». O problema não está nessa falha, nem na placa que perspectivava a inauguração pela senhora Ministra, por motivos, certamente, bem mais importantes que os que invocámos. É mais o modo como se dá conta do recado -- e esse modelo de acção do tipo «dar conta do recado» -- que começa a incomodar.

2. Quando há algum tempo vogou por aí, em múltiplas formas e suportes, a ideia de que a senhora Ministra teria dito, em jeito de triunfo, ter perdido os professores mas ganho a população, confessamos não ter, primeiro, entendido tal juízo e, depois, acreditado ter dito tal. Só invertendo a escala de valores essa afirmação ganharia sentido: é possível prestar «culto» à educação, esvaziando totalmente o seu significado. Por isso, tal dito não implicaria um desprezo pelos professores, antes seria o procedimento «correcto» de alguém que nessa linha de presunção «teocrática» continua esvoaçando intacta sobre as contradições, insucessos e ineficácia da acção.

O que a senhora Ministra fez não foi mais do que de uma penada revogar todo um percurso que se instituíra na escola e no sentido de valorização de uma comunidade educativa e que tinha nos professores não o eixo fundamental mas uma parte importante dessa comunidade. «Perder os professores» é, inquestionavelmente, a instituição e defesa de uma comunidade de aprendizagem manca, falha de sentido, de objectivos e de eficácia. De resto, em todo o mundo o contrário do que esse tipo de discurso denuncia, a valorização das comunidades de ensinantes e aprendentes, é que está na base do seu, deles, sucesso educativo.

3. Esse modo de acção tem no discurso «contra» os sindicatos, parte do arsenal argumentativo da defesa da sua acção (sem sabermos, para já, até que ponto de defesa da política do Governo para a Educação). Reduzir os sindicatos a uma mera expressão corporativa pode há muito ter perdido o seu poder argumentativo e mobilizador, principalmente quando os sinais da «sociedade civil» revelam à saciedade a ineficácia dessa desqualificação. Afinal, o recente parecer do Provedor de Justiça veio colocar o acento nos discurso mais razoável e, parece, não ser o do Ministério da Educação, mas o dos sindicatos. Além do mais, choca aos democratas ver alguém que recusa aos sindicatos, independentemente da avaliação que se possa fazer da sua acção, o seu papel constitucionalmente garantido de participação na discussão política. A democracia participativa é isto, e esta, a democracia, por mais que isso incomode, não se esgota no voto! Essa conversão dos sindicatos em «buc emissaire» pode ter os seus efeitos propagandísticos, mas não resolve problema algum! Aliás, os factos revelam a falência dessa estratégia! A senhora Ministra, calou, ficou muda recentemente, ao vivo e a cores, ante as objecções de um sindicalista! É que a «cassete» só vinga na ignorância do factos e estes, infelizmente para ela, não são resolvidos com chavões, mas com humildade e espírito democrático. E calar, ante os argumentos expostos é perder a razão! Ou ver a forma como argumentou contra aquele cidadão que a questionou e discordou em directo. Melhor fora que tivesse calado, porque incomoda à brava que vá faltando, nesses actos e omissões, a razão, a humildade e o espírito democrático!


(continua)




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