27 maio, 2008

Pois é...

Seria de uma profunda e inqualificável acto de injustiça culpar o Governo de José Sócrates pela situação de um certo aperto que se vive e se reflecte fundamentalmente na classe média. Se culpas nenhumas se podem reportar a ele pela conjuntura, não significa, porém, que se tenham que aceitar todas as desculpas que engendre  para explicar o aperto na classe média.

É comum colocar de enfiada as culpas de tudo que de mal venha ao mundo do trabalho e dos trabalhadores no processo de globalização, como se de um horizonte inelutável se trate e contra o qual qualquer esforço de o contrariar ou mudar se torna ineficaz e parvo. Afinal se a livre concorrência não funciona, se a sociedade de marcado não introduz, ainda que me ténues lampejo de ser, qualquer factor de justiça, resta-nos a tarefa de tentar perceber, ante a impotência de muita gente, se aos governos de pequenos países nada mais resta que baixar os braços e deixar que as culpas se casem para outras bandas, deixando por cá solteiros apenas os culpados. Naturalmente que não falte quem apregoe por aí a realidade bem instalada de um Estado Social... pode ser que sim, pode ser que no término de uma discussão bem argumentada se perceba que de facto ele existe por aí. Será que se manifesta no aumento das prestações sociais e num novo código laboral?  Sinais ineficazes e contraditórios e, já agora, insuficientes para convencer sem lugar para dúvidas todas quantos se apercebem da realidade, da sua realidade, pela reflexão que sobre si fazem a partir das suas experiências e angústias sem o papão da globalização a fazer sombra sobre a verdade e crueza dos problemas que realmente sentem.

Costumam os governos nestas  situações e com o argumento de que estas medidas serão aceites se bem explicadas, vir para o terreno e desdobrar-se em explicações sobre a bondade de tais medidas e esforçando-se para mostrar a luz que do fundo do túnel borboleta. Dizia Noam Chomsky, em 1994 pensamos,  que este problema de relações públicas continua por resolver porque, argumentava ele,  é difícil fazer apelo directo às massas na base de um princípio liberal de que os ricos devem pilhar os pobres. Quando alguém como Manuela Ferreira Leite, com a sua experiência e passados políticos bem conhecidos e documentados, apoia certas medidas do governo, não está só a apoiar esse governo, mas também a denunciar nele a violação da sua identidade.

Exageramos certamente, mas não há mentira que pegue se não tiver lá no fundo uma pitada de verdade.